Entre as maiores
dificuldades enfrentadas pelos profissionais envolvidos na liderança de uma
obra estão os boicotes promovidos pelos funcionários. As motivações para estes
conflitos são diversas, ou seja, insatisfação com salários, condições sub
humanas de alojamento, higiene e alimentação no canteiro, falta de segurança ou
prazos impraticáveis. Enfim, tudo aquilo que está descrito nas normas técnicas
brasileiras mas que dificilmente se pratica com seriedade em obras civis.
Diante desta infeliz
constatação, os gerentes de obras nem sempre conseguem conquistar a confiança
dos trabalhadores e desenvolver de forma adequada e segura algum serviço, o que
desencadeia uma série de conflitos. Assim, é possível afirmar que o bom
funcionamento da hierarquia de um sistema produtivo é proporcional ao respeito mútuo
praticado entre os parceiros e colaboradores de uma determinada organização.
Operários, Tarsila do Amaral, 1933
As típicas figuras do
gerente de obra truculento e autoritário, da arquiteta tresloucada e
escandalosa ou do coordenador de projeto jovem e inseguro que caem de paraquedas
nesta situação, podem ser bem sucedidas dentro de um canteiro de obras desde
que, de alguma forma, inclua no seu repertório a diplomacia e o respeito aos mais primários
códigos de ética que regem as relações profissionais e humanas.
A fronteira da sanidade
é frequentemente ultrapassada na ânsia de se cumprir as metas de um serviço e
com isso, os limites físicos e emocionais dos trabalhadores podem ser muitas
vezes considerados, pela alta gestão, como as fraquezas que impedem o sistema
de alcançar a máxima produtividade e assim, vencer a concorrência.
Embora a construção
civil seja um dos motores da economia do país e tenha a simpatia dos governos
por possuir alta e rápida empregabilidade, é um dos setores que mais usurpa os
direitos trabalhistas e um dos que mais desrespeita as normas de conduta social.
Fraudes em obras públicas, desrespeito pela legislação urbanística, desprezo
pelas normas de segurança e saúde são comuns neste setor. Assim, fica evidente
o motivo pelo qual as maiores falcatruas da política nacional, as mais
indignantes ações de corrupção e os maiores picaretas estejam relacionados à
construção civil, pública ou privada.
Desta forma, não somos
naturalmente bem visto por pessoas que se encontram em posições sociais
consideradas inferiores, principalmente por trabalhadores braçais, que
consciente ou inconscientemente externam as suas indignações com as injustiças.
Representamos o sistema de poder, mesmo não concordando e não fazendo parte
diretamente dele.
Quando se trata de
obras civis a gente se acostuma a lidar com cifras muito elevadas e dimensões
gigantescas, o que pode causar uma falsa sensação de poder excessivo sobre os
objetos e as pessoas. Cem mil reais podem parecer uma quantia irrisória para a
construção de uma residência hoje em dia, mas é, na maioria das vezes, o
recurso conquistado a duras penas por uma família, por exemplo. Geralmente este
valor é proveniente de empréstimos bancários a juros estratosféricos. Mas,
fazer arquitetura não é só lidar com recursos financeiros e posicionar objetos,
é, sobretudo, fazer algo com e para as pessoas.
Concordo que nossa
classe profissional também não tenha as melhores condições em relação aos
direitos trabalhistas no Brasil. Já ouvi a frase “o pedreiro não me respeita”
inúmeras vezes de diferentes perfis de profissionais, nem sempre com o mesmo
sujeito. A palavra pedreiro pode ser substituída por empreiteiro, engenheiro,
carpinteiro e até cliente, de forma que as relações dentro de uma obra só
refletem a agressividade pela qual o sistema se alimenta para que bem ou mal,
funcione.
O respeito por nós
reivindicado está proporcionalmente relacionado ao nosso comprometimento no
combate às injustiças de nosso país, seja em qualquer âmbito de atuação.
Érico Masiero, colaboração Maurício Gomes, 16 Abril 2013
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