terça-feira, 17 de setembro de 2013

Os cursos de mestrados, doutorados e demais pós-graduações não têm sido suficientes para formar o número necessário de professores e em grau de qualidade compatível com a demanda dos próximos anos. A CAPES, 2013 (Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) (1), órgão federal ligado ao Ministério da Educação, destinou no ano de 2012, 692 bolsas de estudo para a formação de mestres e doutores no país nas áreas de arquitetura e urbanismo, no entanto, nem todos os candidatos se tornarão pesquisadores ou docentes em instituições que garantam tanto a continuidade dos estudos como o desenvolvimento e a transferência do conhecimento. Muitos candidatos apenas cumprem as exigências das universidades e dos órgãos de fomento à pesquisa de forma que nem sempre as monografias, as dissertações e as teses se revertem em benefícios significativos para a sociedade.
Pode ser verificado respectivamente pelas Figuras 1 e 2, que segundo a CAPES, 2013 o ritmo de formação de docentes em arquitetura está aquém do necessário para atender a demanda de forte tendência de criação de vagas nos cursos de graduação em arquitetura e urbanismo, de acordo com estimativas da ABEA, 2013.

Figura 1, tendência de crescimento do número de bolsas destinadas
à área de arquitetura e urbanismo
Fonte: CAPES, 2013

Figura 1, tendência de crescimento estimado da criação
de vagas em cursos de graduação em  arquitetura e urbanismo
Fonte: ABEA, 2013

Ressalva-se que, apesar de existir outras fontes de financiamento para a formação de docentes como as agências estaduais de fomento e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, CNPq, a relação entre vagas e docentes continua sendo preocupante pelo fato de nem todos os mestres e doutores partirem para a atuação no sistema de ensino.  
A CAPES, 2013 também tem relatado dificuldades para selecionar candidatos suficientes para preencher todas as vagas disponíveis do Programa Ciência Sem Fronteiras (2), devido à baixa qualificação dos profissionais graduados e ao conhecimento insuficiente de outro idioma dos candidatos. Tanto que o Ministério da Educação lançou recentemente o programa Inglês Sem Fronteiras, curso de idioma disponibilizado on line, para tentar melhorar o alcance do nível de proficiência exigido nos exames linguísticos para o ingresso nas Universidades Anglófonas e minimizar a sobra de bolsas de estudo. Mesmo sabendo de todas as dificuldades encontradas pelo principal órgão de fomento a formação de profissionais de alto nível do Brasil, constata-se que 48% dos arquitetos julgam ter bons conhecimentos de inglês segundo o Censo do CAU, no entanto, poucos se aventuram pela academia ou outras áreas especializadas, embora haja oferta de recursos.
É certo que o CSF prioriza as áreas exatas e aqueles com maior identificação com as áreas de humanas têm chances reduzidas para obtenção desta fonte de recurso. Assim, das 22.229 bolsas de estudos distribuídas em todos os níveis até junho de 2013, 8.734 foram destinadas às áreas de Engenharia e Demais Áreas Tecnológicas. Arquitetos até levariam vantagem na concorrência pelas bolsas de pós-graduação por terem formação abrangente e conseguirem transitar bem entre as áreas tecnológicas, entre as quais são consideradas prioritárias para o governo, mas não é o que tem acontecido. Somente 135 bolsas foram destinadas à área de Novas Tecnologias de Engenharia Construtiva, por exemplo, onde alguns arquitetos teriam grandes chances de se inserirem, somente 6 bolsas foram destinadas nesta categoria para formação de candidatos ao Doutorado Pleno no exterior desde o início do programa em 2011.
A pesquisa do CAU relata ainda que, 87% dos arquitetos estão satisfeitos com a formação recebida pela instituição de ensino onde concluíram a formação em Arquitetura e Urbanismo. No entanto, fica evidente que a falta de acesso de muitos profissionais, interessados em melhorar a sua formação acadêmica, às linhas de financiamento disponíveis pelo governo se deve ou por falta de iniciativa dos próprios candidatos, ou por desconhecimento das oportunidades, ou principalmente por falta de preparo acadêmico.
No caminho oposto às dificuldades enfrentadas na formação de recursos humanos qualificados no país, Maragno, (2012) (3) retrata o vertiginoso crescimento do número de escolas de arquitetura no Brasil. São quase 300 cursos com uma distribuição desigual pelo país, sendo que a maioria está concentrada na região Sudeste. Portanto, a principal questão é: como preencher as novas vagas para docentes nestes novos cursos, se o nosso sistema de formação de profissionais de alto nível mal consegue suprir a demanda para os cursos existentes?
Diante destes dados surgem duas notícias, uma boa e outra ruim. A boa é que os arquitetos nunca foram tão solicitados quanto atualmente para participar das questões cruciais no desenvolvimento do país. Questões de infraestrutura, habitação, meio ambiente, aplicação de novas tecnologias construtivas, aumento da eficiência energética dos edifícios ou preservação do patrimônio cultural e planejamento urbano são temas altamente relevantes e áreas que podem absorver grande número de profissionais, desde que estes estejam preparados para desempenhar tais tarefas. A notícia ruim é que com pouca qualificação, os profissionais terão poucas oportunidades e acesso restrito para participar de serviços especializados. Assim, fica esclarecido o motivo pelo qual no Censo do CAU, é apresentado que 50% dos profissionais atribuem à valorização profissional pela sociedade como o maior obstáculo para o exercício profissional, ou seja, há excesso de profissionais desempenhando funções que exigem pouca qualificação. O acesso ao mercado continuará restrito caso não haja mudança de atitude por parte de profissionais, instituições de ensino, principalmente de algumas privadas e órgãos do governo e passem a focar no objetivo de formar lideranças e pessoas seguras para tomar decisões importantes e de interesse nacional.
Desafios e Recomendações
Enquanto a necessidade das décadas de 90 e 2000 era expandir o sistema de ensino superior e garantir um acesso mais efetivo às camadas menos favorecidas economicamente, agora o desafio para os próximos anos é, sem dúvida, garantir a qualidade do sistema educacional como um todo para que os profissionais tenham acesso às oportunidades de trabalho de alta relevância.
Apesar do arquiteto e urbanista ter caráter generalista, o profissional não deve se limitar a tarefas genéricas e superficiais. É necessário que os profissionais consigam transitar com desenvoltura entre tarefas que exijam diversos níveis de conhecimento tanto prático como teórico, de acordo com as solicitações atuais e com as novas oportunidades.
Por se tratar também de uma profissão que depende da prática efetiva e do exercício diário do oficio, a formação em arquitetura deve investir um esforço mais efetivo em equilibrar os aspectos teóricos e práticos na formação. Apesar de algumas escolas considerarem o estágio como horas complementares na formação, em muitos casos, esta experiência não atribui qualquer diferencial no curriculum e nem sempre contribui para a inserção do profissional no mercado. No entanto, as escolas se baseiam em geral em avaliações teóricas e, muitas vezes, subjetivas para habilitar um profissional. O período do estágio, da forma como está organizado, é mal supervisionado, e pouco avaliado por instituições e profissionais experientes, salvo em algumas exceções. Não encaminha o estudante para a especialização, nem contribui para que este tenha acesso a novas oportunidades de trabalho. A falta de reconhecimento e da formalização da experiência prática representam entraves que limitam o acesso dos profissionais ao mercado de trabalho em geral.
Assim, nosso sistema educacional abre poucas possibilidades de desenvolvimento profissional e desperta pouco interesse no aluno para a continuidade dos estudos. Atualmente, as formações específicas são concentradas nos cursos de pós graduação, os quais ainda possuem grandes entraves para o acesso igualitário dos graduados ao sistema público educacional. As exigências que as universidades do exterior fazem aos candidatos pelo conhecimento sobre o assunto a ser abordado no intercâmbio do CSF e do idioma do país em que se pretende estudar, são apenas indicadores que estamos muito aquém do nível de estudo praticado internacionalmente. Somente os candidatos vindos de universidades públicas federais e estaduais conseguem atingir o nível exigido para a realização do intercâmbio, os quais são maioria absoluta nas submissões de propostas para o CSF.
Portanto, o alto número de profissionais que se dedicam a tarefas pouco especializadas se deve ao fato do sistema educacional contar com estrutura ainda precária para a formação de mão obra em nível de graduação e não incentivar a continuidade dos estudos. Assim, forma-se um grande contingente de profissionais que concorrem entre si por trabalhos pouco especializados e que nem sempre contribuem para o desenvolvimento das áreas consideradas prioritárias no país. As insatisfações recorrentes dos profissionais são representadas respectivamente pelas parcelas que consideram a falta de valorização profissional pela sociedade, a má remuneração e à falta de acesso ao mercado. Os números divulgados pelo Censo do CAU explicam que a má remuneração decorre da alta concorrência entre profissionais com baixo índice de especialização e, portanto, com pouco acesso a oportunidades de trabalho.
Para que o acesso ao mercado de trabalho seja otimizado, sugere-se que os órgãos governamentais responsáveis pelo fomento à qualificação de recursos humanos considerem a formatação de novos meios de aparelhamento das instituições públicas e privadas brasileiras no sentido de se oferecer vagas para o desenvolvimento profissional no estágio pré formatura em arquitetura e urbanismo. Neste sentido, é necessário que se criem programas de extensão universitária e desenvolvimento profissional específicos em parceria com as instituições que comprovem competência perante a sociedade em áreas do conhecimento prioritárias para o país. Há que se criar um pacto entre as instituições que estejam de fato comprometidas com a transferência de conhecimento e com a formação de lideranças.
NE
Leia a primeira parte deste artigo: MASIERO, Érico. Censo do CAU e os desafios na formação em Arquitetura e Urbanismo (parte1). Drops, São Paulo, 14.071, Vitruvius, ago 2013 <http://www.vitruvius.com.br/revistas/

1
BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. CAPES. Coordenadoria de Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. Dados Estatísticos. 2013. Disponível em http://geocapes.capes.gov.br/geocapesds/acessado em 25 Junho 2013 

2
BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. CAPES. Coordenadoria de Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. Painel de Controle do Programa Ciência Sem Fronteiras, 2013. Disponível em:http://www.cienciasemfronteiras.gov.br/web/csf/painel-de-controle acessado em 25  junho 2013

3
MARAGNO, Gogliardo Vieira. Questões Sobre a Qualificação e o Ensino de Arquitetura e Urbanismo no Brasil. In. Anais... XXXI Encontro Nacional sobre Ensino de Arquitetura e Urbanismo. ABEA: São Paulo, 2012. Disponível em http://www.abea-arq.org.br/?p=382 acessado em 25 Junho 2013.

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